Mulher que deu golpe no Exército por mais de 30 anos é condenada e terá que devolver R$ 3,7 milhões
13/03/2025
(Foto: Reprodução) Ana Lucia Umbelina Galache de Souza se passou por filha de ex-combatente da Força Expedicionária Brasileira (FEB) com documentos fraudados. Condenação é em última instância e não cabe mais recurso. Além da devolução do dinheiro, ela deve cumprir 3 anos e 3 meses de prisão em regime inicialmente aberto. Ana Lucia Umbelina Galache é sobrinha-neta do ex-militar falecido em 1988.
Reprodução/Redes sociais
O Superior Tribunal Militar (STM) condenou Ana Lucia Umbelina Galache de Souza por crime contra o patrimônio e estelionato após a mulher se passar por filha de um tio-avô, ex-combatente da Segunda Guerra Mundial. Ela terá que devolver R$3,7 milhões por ter recebido indevidamente pensão do Exército. A condenação também prevê 3 anos e 3 meses de prisão em regime inicial aberto.
O Superior Tribunal Militar (STM) condenou Ana Lucia Umbelina Galache de Souza por crime contra o patrimônio e estelionato. Ela se passou por filha de um ex-combatente da Segunda Guerra Mundial e, durante 33 anos, recebeu indevidamente R$ 3,7 milhões em pensão. A pena, divulgada nesta quinta-feira (13), determina a devolução de todo o valor recebido, além de 3 anos e 3 meses de prisão em regime inicialmente aberto.
✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 MS no Whatsapp
A condenação aconteceu no dia 28 de fevereiro, em última instância, não existindo mais possibilidade de recurso. Segundo o processo, Ana Lucia era sobrinha-neta de Vicente Zarate, mas fraudou documentos e recebeu pensão entre 1988 e 2022 como se fosse filha dele.
O g1 tentou contato com Ana Lucia por telefone, mas as ligações não foram atendidas.
A Defensoria Pública da União (DPU), que fez a defesa dela, informou que não representa mais Ana Lucia desde o dia 14 de dezembro de 2024 devido à 'impossibilidade de interposição de novos recursos'.
A fraude
Documentos aos quais o g1 teve acesso revelam que o esquema fraudulento começou quando Ana Lucia ainda era menor de idade, em 25 de setembro de 1986. Ela foi registrada em um cartório de Campo Grande como sendo filha de Vicente Zarate e Natila Ruiz. Com a nova documentação, ela obteve, também, outra Carteira de Identidade, e outro Cadastro de Pessoa Física (CPF), nestes constando o sobrenome Zarate.
Com os novos documentos, Ana Lucia requereu habilitação como pensionista de Vicente Zarate na Seção do Serviço de Inativos e Pensionistas (SSIP 9) do Exército brasileiro. O pedido foi deferido, e a mulher passou a receber, ainda em 1988, pensão integral como filha de Segundo Sargento e seguiu até 2022 quando foi denunciada. O prejuízo causado totalizou R$3,7 milhões.
Initial plugin text
A Defensoria Pública da União (DPU) chegou a pedir absolvição de Ana Lucia, alegando “ausência de intenção”, já que o registro como filha do ex-combatente foi feito quando ela ainda era menor de idade, mas o STM negou. Depois disso a DPU entrou com um novo recurso, negado agora em última instância.
Além do comparecimento de Ana Lucia ao Exército, o ministro relator, Artur Vidigal de Oliveira, elencou outros cinco motivos que levaram ao entendimento de que houve crime de estelionato. Confira abaixo:
Ana Lucia mantinha em uso duas identidades e dois CPFs (com o nome antigo e com o nome fraudado). Ela somente utilizava o nome Ana Lucia Zarate para receber a pensão;
Mesmo orientada pelo marido para que interrompesse a pensão, ela deu continuidade ao esquema;
Ela confessou o esquema criminoso no interrogatório;
Não seria possível considerar que ela foi adotada por Vicente Zarate, já que não houve trâmite legal de adoção;
Abaixo, confira a cronologia do trâmite na Justiça:
➡️ Dezembro de 2021: De acordo com a ação penal, a avó de Ana Lucia, Conceição Galache, procurou a Polícia Civil e a Administração Militar para informar que a mulher não era filha de Vicente Zarate.
Conceição denunciou que a neta utilizava o nome de Ana Lucia Zarate apenas nas tratativas com a Administração Militar, mantendo o nome Ana Lucia Umbelina Galache para todos os demais atos da vida civil, inclusive para seu casamento, celebrado em 2 de março de 1990.
➡️ 2022: Após meses de investigação, por meio de uma sindicância, foi comprovado que Ana Lucia não era filha de Vicente, sendo na verdade sobrinha-neta do militar. Ainda conforme a ação judicial, no mesmo ano o pagamento foi suspenso e a mulher foi intimada para prestar esclarecimentos.
Durante interrogatório, ré confirmou a história e disse que dividia a pensão oriunda da fraude com sua avó, que teria ajudado na obtenção dos documentos fraudulentos. Ela admitiu ainda que o caso só veio à tona após Conceição exigir que lhe fossem repassados R$ 8 mil, sob pena de denunciá-la.
Ana Lucia contou também que não vivia com seu tio-avô, Vicente Zarate, e não o tratava como pai. Ela relatou que se apresentava com o sobrenome Zarate apenas para fins de recebimento da pensão do Exército - ou seja, passando a utilizar dois nomes: o verdadeiro (Ana Lúcia Umbelina Galache de Souza), e o falso, (Ana Lucia Zarate), para manter a fraude, ao longo de 33 anos (de 1988 a 2022).
A avó, que é apontada como cúmplice do caso, faleceu em maio de 2022 e não chegou a ser ouvida nas investigações.
➡️ Fevereiro de 2023: Ana Lucia foi condenada pela Justiça Militar em Mato Grosso do Sul a devolver o valor de R$ 3.723.344,07, pelo prejuízo causado ao Exército. A pena também prevê três meses de prisão. A mulher recorreu da decisão em liberdade.
➡️ Novembro de 2024: O Superior Tribunal Militar (STM) negou o recurso apresentado por Ana Lucia. A Defensoria Pública da União (DPU), responsável pela defesa da mulher, justifica o crime pela “ausência de intenção”, visto que o registro como filha do militar foi feito quando ela era menor de idade. Na época, a ré tinha 17 anos.
A Justiça entende que a mulher cometeu crime de estelionato ao se passar por falsa dependente do ex-combatente para obter vantagens, tendo plena consciência de que estava enganando o serviço militar para receber a pensão.
LEIA TAMBÉM
Como mulher enganou o Exército em MS e recebeu R$ 3,7 milhões de pensão em 33 anos
Direito à pensão militar
Mensalmente os militares pagam alíquota de 10,5% para pensão militar dos dependentes. Segundo o advogado e mestre em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Igor Santos, a pensão por morte é um direito dos dependentes do militar falecido, mas há ordens de prioridade que definem quem pode receber.
“Cônjuges e filhos, por exemplo, fazem parte da primeira ordem de prioridade. Já os pais têm direito caso o militar não seja casado ou não tenha filhos”, explica.
O advogado defende que mais fiscalizações sejam feitas em relação às pensões pagas aos dependentes de militares das forças armadas, visando a proteção da própria instituição e do Estado brasileiro, para que fraudes sejam evitadas.
“A falta de compliance, de uma preocupação fiscal, é algo tão profundo que pode se tornar um problema ainda maior com a possibilidade de fraudes que temos hoje em virtude da tecnologia”, ressalta o advogado.
Confira abaixo a lista de dependentes por ordem de prioridade:
Primeira ordem de prioridade
Cônjuge;
Companheiro (a) em união estável;
Pessoa desquitada, separada judicialmente ou divorciada do militar, desde que receba pensão alimentícia;
Filhos ou outros menores de idade, que receberão até 21 anos de idade ou 24, caso comprovem que são estudantes universitários.
Segunda ordem de prioridade
A mãe ou o pai que comprovem ser dependentes econômicos do militar.
Terceira ordem de prioridade
Irmão órfão que comprove a dependência econômica do militar, e receberá até os 21 anos de idade ou 24, caso seja universitário ou apresente invalidez;
Qualquer pessoa escolhida pelo militar, desde que se comprove dependência econômica e tenha até 21 anos de idade; pessoa inválida até quando durar a invalidez; ou qualquer pessoa maior de 60 anos de idade que comprove dependência econômica.
LEIA TAMBÉM
Como um exército rebelde budista ajudou a resgatar os brasileiros escravizados por máfia de golpes cibernéticos
Como um exército rebelde budista ajudou a resgatar os brasileiros escravizados por máfia
Veja vídeos de Mato Grosso do Sul: